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Novas regras da ANS para cancelamento de planos de saúde: o que muda para o consumidor?

Novas normas da ANS mudam prazos, notificações e direitos dos consumidores inadimplentes

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) publicou a Resolução Normativa ANS nº 593/2023, que traz novas regras para cancelamento de planos de saúde por inadimplência, vigentes a partir de dezembro de 2024. A normativa estabelece mudanças importantes, como prazos maiores para regularização de débitos e novos meios de notificação obrigatória, visando proteger os direitos dos consumidores e aumentar a transparência no setor de saúde suplementar.

Essas alterações impactam diretamente consumidores e operadoras de planos de saúde, especialmente em questões relacionadas à notificação de inadimplência, modernização dos meios de comunicação e flexibilização das regras para diferentes tipos de planos. Nos tópicos seguintes, exploraremos como essas mudanças afetam o dia a dia dos beneficiários, os direitos garantidos pela nova regulamentação e os desafios práticos para a sua implementação.

Consumidores afetados pelas novas regras

A Resolução Normativa ANS nº 593/2023 redefine os grupos de beneficiários impactados pelas mudanças no processo de notificação de inadimplência e cancelamento de planos de saúde. Suas disposições são aplicáveis a consumidores em situações específicas, conforme previsto no art. 3º da norma, que detalha os conceitos relevantes. A seguir, os beneficiários afetados são apresentados com base na redação do dispositivo legal:

Pessoa natural contratante

De acordo com o art. 3º, inciso I, da RN nº 593/2023, são consideradas pessoas naturais contratantes aquelas que celebram contratos diretamente com a operadora de planos de saúde e assumem a responsabilidade pelo pagamento das mensalidades. Esse grupo abrange:

  • Titulares de planos individuais ou familiares, contratados diretamente com a operadora.
  • Empresários individuais que contratam planos coletivos empresariais, sendo eles responsáveis pelo pagamento e pela celebração do contrato.

Esse conceito unifica beneficiários de diferentes tipos de contratação, garantindo-lhes as mesmas proteções previstas na resolução.

Beneficiários que pagam a mensalidade do plano coletivo diretamente à operadora

O art. 3º, inciso II, da RN nº 593/2023 abrange os beneficiários vinculados a planos coletivos que realizam pagamentos diretamente à operadora, mesmo que a relação contratual principal seja intermediada por uma pessoa jurídica. Esse grupo inclui:

  • Beneficiários de autogestões.
  • Contratos administrados por administradoras de benefícios.
  • Ex-empregados que mantêm o plano de saúde em decorrência dos direitos previstos nos arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998, relacionados à continuidade da assistência médica após o encerramento do vínculo empregatício.

Essa disposição assegura que mesmo beneficiários de planos coletivos, frequentemente gerenciados por intermediários, tenham acesso às garantias das novas regras.

Contratos antigos permanecem regidos pelas normas anteriores, mas…

A regulamentação estabelecida pela Resolução Normativa ANS nº 593/2023 traz disposições específicas para contratos celebrados antes de sua vigência, diferenciando-os dos contratos novos. O art. 9º da RN nº 593/2023 e seus parágrafos definem como devem ser realizadas as notificações por inadimplência nesses casos, permitindo flexibilidade para adaptação aos novos meios de comunicação. A seguir, apresentamos as regras aplicáveis.

Manutenção das disposições contratuais antigas

De acordo com o art. 9º, §3º, da RN nº 593/2023, os contratos celebrados antes de 1º de dezembro de 2024 devem seguir as disposições contratuais vigentes à época de sua assinatura para a realização de notificações por inadimplência. Isso significa que, nesses contratos, a operadora continuará utilizando os meios de notificação previamente acordados, salvo se houver aditamento contratual.

Aditamento contratual para inclusão de novos meios de notificação

O mesmo §3º do art. 9º permite que as operadoras aditem os contratos antigos para incluir os novos meios de notificação previstos na Resolução Normativa nº 593/2023, como e-mail certificado, WhatsApp e SMS com resposta do beneficiário. Essa medida visa adaptar os contratos antigos à modernização trazida pela regulamentação.

Uso dos novos meios sem aditamento contratual

Caso o contrato antigo não seja aditado, o art. 9º, §4º, estabelece que a utilização dos novos meios de notificação pela operadora será considerada válida desde que o beneficiário confirme a ciência da notificação. Essa disposição, alterada pela RN nº 617/2024, prevê que a resposta do beneficiário à notificação suprirá eventuais lacunas contratuais, permitindo a suspensão ou rescisão do contrato, ou ainda a exclusão do beneficiário em caso de planos coletivos.

Impactos práticos das novas regras para os consumidores

A Resolução Normativa ANS nº 593/2023, com alterações introduzidas pela RN nº 617/2024, trouxe mudanças significativas que impactam os consumidores de planos de saúde. A seguir, são destacados os principais efeitos práticos dessas novas regras, com fundamentação nos dispositivos normativos aplicáveis.

Exigência de pelo menos duas mensalidades atrasadas

De acordo com o art. 4º, §3º, da RN nº 593/2023 (alterado pela RN nº 617/2024), o cancelamento do plano de saúde por inadimplência só poderá ocorrer quando o beneficiário acumular pelo menos duas mensalidades em atraso, consecutivas ou não, dentro de um período de 12 meses.

Essa mudança substitui a regra anterior, que permitia o cancelamento após 60 dias de atraso, mesmo que referentes a apenas uma mensalidade. Essa exigência visa:

  • Garantir mais tempo para que o consumidor regularize sua situação financeira.
  • Evitar cancelamentos abruptos que poderiam causar a interrupção injusta do plano.

Notificação obrigatória e prazo para regularização

O art. 4º da RN nº 593/2023 (alterado pela RN nº 617/2024) exige que a operadora realize a notificação por inadimplência até o 50º dia de atraso como pré-requisito para exclusão, suspensão ou rescisão unilateral do contrato. Além disso:

  • O beneficiário deve ter um prazo mínimo de 10 dias a partir da notificação para quitar o débito, conforme disposto no art. 6º, caput.
  • Caso o débito seja contestado pelo beneficiário, a operadora deve responder o questionamento e conceder novo prazo de 10 dias para regularização (art. 6º, §1º).

Essa notificação prévia contribui para a estabilidade contratual, garantindo ao beneficiário uma chance justa de regularizar a situação antes do cancelamento do plano.

Inovações nos meios de comunicação

O art. 8º da RN nº 593/2023 (alterado pela RN nº 617/2024) introduz meios modernos para notificação de inadimplência, como:

  • E-mail certificado ou com confirmação de leitura.
  • Mensagens via SMS ou aplicativos de mensagens instantâneas (ex.: WhatsApp), desde que o destinatário confirme o recebimento (art. 8º, §2º).
  • Ligação telefônica gravada, com validação de dados do beneficiário.
  • Carta com aviso de recebimento (AR) ou entrega por preposto da operadora.

Essas inovações modernizam o processo de notificação, tornando-o mais ágil e acessível. Ao mesmo tempo, os métodos tradicionais permanecem válidos para atender consumidores com menor acesso à tecnologia.

Proibição de penalizações indevidas

O art. 4º, §4º, da RN nº 593/2023 (alterado pela RN nº 617/2024) estabelece que o período de inadimplência não pode ser considerado válido para exclusão do beneficiário ou rescisão do contrato se a operadora:

  • Não disponibilizar boletos válidos.
  • Não proceder descontos em folha ou em conta corrente, conforme contratado.

Essa regra assegura que o consumidor não seja penalizado por falhas administrativas da operadora.

Obrigações de clareza e comprovação da notificação

Conforme o art. 10 da RN nº 593/2023 (alterado pela RN nº 617/2024), a notificação deve conter informações detalhadas sobre:

  • A identificação do plano e do beneficiário.
  • O valor atualizado do débito.
  • O período de atraso e o prazo para regularização.

O art. 5º da RN nº 593/2023 determina que a operadora deve comprovar de forma inequívoca que a notificação foi enviada e recebida, sob pena de invalidar o ato de exclusão ou rescisão do contrato.

Flexibilização para planos odontológicos

De forma específica, o art. 8º, §7º, da RN nº 593/2023 (alterado pela RN nº 617/2024) isenta os planos exclusivamente odontológicos da obrigação de realizar notificações via carta com AR ou preposto, simplificando o processo nesses casos.

Conclusão

A Resolução Normativa ANS nº 593/2023, com as alterações trazidas pela RN nº 617/2024, apresenta avanços no sentido de aumentar a proteção ao consumidor, mas ainda deixa desafios que precisam ser monitorados de perto. Embora as mudanças garantam prazos maiores para regularização de inadimplências e modernizem os meios de notificação, é necessário assegurar que as operadoras cumpram rigorosamente as novas obrigações.

A exigência de comprovação inequívoca da notificação e a proibição de penalizações indevidas, como em casos de falhas administrativas das operadoras, são medidas importantes para impedir abusos contra os beneficiários. No entanto, a aplicação dessas regras na prática dependerá de fiscalização efetiva por parte da ANS e da conscientização dos consumidores sobre seus direitos.

Apesar de avanços pontuais, consumidores ainda enfrentam desafios em um mercado onde as operadoras, muitas vezes, têm mais poder de negociação e recursos para se defender. É essencial que os beneficiários estejam atentos, atualizem seus dados cadastrais e exijam a aplicação das garantias previstas nas novas normas, recorrendo ao Poder Judiciário ou aos órgãos de defesa do consumidor sempre que necessário.

Portanto, embora a normativa represente um passo positivo, ela não resolve integralmente os problemas estruturais do setor. O compromisso deve ser contínuo, tanto da ANS quanto dos consumidores, para garantir que os direitos sejam efetivamente respeitados e que o acesso à saúde suplementar não seja prejudicado por práticas abusivas.

Sobre o autor:

Pós-doutorando em Direito na Universidade de São Paulo - USP, Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo - USP, Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário de Brasília - UniCEUB, Especialista em Economia Nacional pela The George Washington University - GWU e Graduado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Procurador Federal na Advocacia-Geral da União.

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