O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que a presença de símbolos religiosos, como crucifixos e imagens, em prédios públicos não desrespeita a laicidade do Estado nem a liberdade de crença. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1249095, em sessão virtual concluída em 26 de novembro.
Por tratar-se de tema com repercussão geral (Tema 1.086), o entendimento firmado será aplicado obrigatoriamente em processos semelhantes nas demais instâncias do Judiciário.
O caso e os argumentos apresentados
O recurso analisado foi interposto pelo Ministério Público Federal (MPF), que buscava reformar decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). O tribunal havia rejeitado a retirada de símbolos religiosos de órgãos públicos da União no Estado de São Paulo. Segundo o MPF, a manutenção desses símbolos seria incompatível com a laicidade do Estado brasileiro.
No entanto, o TRF-3 defendeu que tais elementos representavam não apenas questões religiosas, mas também aspectos culturais relevantes para a sociedade brasileira. Esse entendimento foi confirmado pelo STF.
Aspectos histórico-culturais e liberdade religiosa
No voto que conduziu o julgamento, o ministro Cristiano Zanin destacou a proteção constitucional à liberdade religiosa e à neutralidade estatal. Ele mencionou que, embora o STF já tenha invalidado leis que impunham a presença de símbolos religiosos por violarem a laicidade estatal, a manutenção desses elementos, quando relacionados à manifestação cultural, não afronta a neutralidade do Estado.
Zanin também lembrou que a presença de símbolos religiosos reflete a história e a tradição da sociedade brasileira, marcada desde a colonização portuguesa. Segundo ele, a simbologia, presente em nomes de lugares, feriados religiosos e monumentos, compõe a diversidade cultural do país sem impor crenças ou constranger cidadãos em suas convicções filosóficas ou religiosas.
Tese jurídica fixada
O STF fixou a seguinte tese para o Tema 1.086 de repercussão geral:
“A presença de símbolos religiosos em prédios públicos, pertencentes a qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, desde que tenha o objetivo de manifestar a tradição cultural da sociedade brasileira, não viola os princípios da não discriminação, da laicidade estatal e da impessoalidade“.
Questão jurídica envolvida
A discussão girou em torno do equilíbrio entre o princípio da laicidade estatal e a manifestação da liberdade religiosa, ambos protegidos pela Constituição Federal. A decisão do STF reforça que símbolos religiosos em prédios públicos podem ser mantidos, desde que seu objetivo seja expressar a tradição cultural, sem impor crenças.
Legislação de referência
Constituição Federal de 1988, Artigo 5º, inciso VI:
“É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.”
Constituição Federal de 1988, Artigo 19, inciso I:
“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.”
Processo relacionado: ARE 1249095