O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) suspendeu, em decisão unânime, a vigência da Lei Estadual 11.587/2023 e do Decreto 33.738/2024, que preveem reserva de 5% de vagas de emprego para travestis e pessoas trans em empresas que recebem incentivos fiscais do Estado. A medida, proposta pelo relator desembargador Claudio Santos, permanecerá suspensa até o julgamento definitivo das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs) apresentadas por entidades do setor privado.
Argumentos de inconstitucionalidade
As ações, propostas pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (Fiern), Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do RN (Fecomércio/RN), Federação de Agricultura, Pecuária e Pesca do RN (Faern) e Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Nordeste, questionam a constitucionalidade das normas estaduais. As entidades argumentam que a exigência representa uma intervenção na gestão das empresas e viola a competência exclusiva da União para legislar sobre Direito do Trabalho e normas de contratação, conforme os artigos 22, incisos I e XXVII, da Constituição Federal.
O desembargador relator ressaltou que a obrigatoriedade interfere na livre iniciativa, princípio garantido pelo artigo 170 da Constituição, ao impor obrigações de contratação com potencial impacto econômico. Segundo ele, as medidas afirmativas para inclusão social devem ser equilibradas e fundamentadas, evitando pressões sobre o setor privado.
Repercussão para as empresas e fundamentação da decisão
A Corte considerou ainda que, ao impor a perda de benefícios fiscais em caso de descumprimento, a lei estadual eleva indiretamente a carga tributária, configurando uma majoração indireta de tributos. A modificação de requisitos para o recebimento de incentivos fiscais, segundo o TJRN, desconsidera a autonomia da União para estabelecer normas sobre contratações e condições tributárias.
Posicionamento do Governo do Estado
O Governo do Estado argumentou que a lei visa promover inclusão e dignidade, combatendo a discriminação no mercado de trabalho contra a população trans e travesti. Em defesa da norma, o Estado apontou a similaridade com políticas de reserva de vagas já aplicadas para pessoas com deficiência, defendendo que tais ações podem e devem ser incentivadas no setor privado.
Questão jurídica envolvida
A suspensão da lei estadual pelo TJRN gira em torno de dois principais fundamentos de inconstitucionalidade:
- Competência legislativa exclusiva da União sobre Direito do Trabalho e normas gerais de contratação – Constituição Federal, Art. 22, incisos I e XXVII.
- Princípio da livre iniciativa – Constituição Federal, Art. 170, que assegura ao setor privado autonomia na gestão de recursos humanos, sem imposições estatais arbitrárias que interferem na dinâmica empresarial.
Legislação de referência
- Constituição Federal, Art. 22, I e XXVII: “Compete privativamente à União legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; XXVII – normas gerais de licitação e contratação.”
- Constituição Federal, Art. 170: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.”
Processo relacionado: ADIN 0808853-93.2024.8.20.0000, ADIN 0809046-11.2024.8.20.0000