Uma operadora de caixa foi vítima de assédio moral e racismo em seu ambiente de trabalho, sofrendo ofensas por ser negra e estar grávida. A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) manteve a decisão de primeira instância e condenou a empresa a indenizá-la em R$ 24,7 mil por danos morais. Além disso, a trabalhadora obteve o direito à rescisão indireta do contrato de trabalho e à indenização referente ao período de estabilidade gestacional, totalizando uma condenação provisória de R$ 60 mil.
Ofensas e discriminação no ambiente de trabalho
Testemunhas confirmaram que a trabalhadora era constantemente humilhada pelo gerente da loja, sendo chamada de “preta burra” e acusada de não ser capaz de realizar suas tarefas. Após a comunicação de sua gravidez, o assédio se intensificou e ela foi rebaixada de chefe para auxiliar, com uma redução salarial de 30%. Testemunhas relataram que essa prática também ocorreu com outras empregadas grávidas, enquanto os homens que se afastavam por questões de saúde não eram afetados.
Uma das testemunhas, que também havia engravidado, relatou que o gerente fazia comentários depreciativos, referindo-se às funcionárias como pessoas que “não faziam nada direito”. O gerente ainda espalhou falsos rumores de que a trabalhadora havia sido rebaixada por praticar furtos no caixa, o que nunca foi provado. Esse comportamento discriminatório levou a trabalhadora a registrar um boletim de ocorrência e afastar-se para tratamento de saúde, recebendo, inclusive, benefício previdenciário.
Decisão judicial
A defesa da empresa argumentou que o rebaixamento era uma decisão discricionária do empregador e que não havia provas de racismo ou assédio. No entanto, o juiz Valtair Noschang, da 4ª Vara do Trabalho de São Leopoldo, entendeu que as provas apresentadas confirmavam a prática de assédio moral e discriminação racial por parte do gerente, especialmente contra mulheres grávidas. Ele destacou que o comportamento abusivo do superior hierárquico era evidente e que a empresa se omitiu ao não tomar medidas para proteger a trabalhadora.
Aumento da indenização e julgamento com perspectiva de gênero
Ao analisar os recursos, a 3ª Turma do TRT-RS decidiu aumentar o valor da indenização por danos morais de R$ 16,5 mil para R$ 24,7 mil. O relator do caso, desembargador Marcos Fagundes Salomão, aplicou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e enfatizou que os atos de racismo e sexismo causaram danos morais profundos à trabalhadora.
Ele ressaltou que a empregada foi duplamente discriminada, tanto por ser negra quanto por estar grávida. “A autora foi atingida em sua dignidade como trabalhadora preta, mulher e gestante, sofrendo perseguição e assédio moral. O racismo e o desprezo pela condição de mulher grávida foram evidentes, e a empresa se omitiu, mesmo ciente dos fatos”, afirmou o relator.
A decisão foi unânime, com a participação dos desembargadores Ricardo Carvalho Fraga e Clóvis Fernando Schuch Santos. Cabe recurso da decisão.
Questão jurídica envolvida
A decisão aborda o reconhecimento de assédio moral e discriminação racial e de gênero no ambiente de trabalho, configurando danos morais passíveis de indenização. A aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ foi essencial para avaliar o impacto das ações discriminatórias sobre a trabalhadora.
Legislação de referência
Lei 9.029/1995:
“Art. 1º – Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, salvo nos casos de proteção ao menor, nos termos do inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.”
Constituição Federal, Art. 5º:
“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.”
Fonte: TRTRS