A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que as concessionárias de energia elétrica devem seguir estritamente a forma de comunicação prevista pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ao informar os consumidores sobre interrupções programadas no serviço. O caso envolveu um homem e uma mulher que ingressaram com ação de indenização após perderem 300 litros de leite devido a uma interrupção de 12 horas no fornecimento de energia elétrica. Eles alegaram que a concessionária não cumpriu os requisitos legais de aviso prévio, já que divulgou o corte apenas por meio de emissoras de rádio locais.
Decisão do tribunal estadual e recurso ao STJ
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) deu razão aos consumidores, reformando a decisão de primeira instância e afirmando que a comunicação via rádio não atendeu às exigências da Resolução 414/2010 da Aneel. A norma exigia que o aviso fosse feito por escrito, com comprovação de entrega, ou impresso com destaque na fatura mensal, garantindo a correta notificação dos consumidores.
A concessionária recorreu ao STJ, sustentando que a Lei 8.987/1995, em seu artigo 6º, parágrafo 3º, inciso I, não especifica a forma de comunicação prévia, permitindo o uso de diversos meios, como rádio, jornal ou correspondência simples. Para a empresa, a divulgação via rádio cumpria os requisitos legais.
Interpretação da Lei e poder normativo da Aneel
O ministro Paulo Sérgio Domingues, relator do caso, destacou que a Lei de Concessões (Lei 8.987/1995) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) devem ser interpretados de forma a garantir a continuidade, adequação, eficiência e segurança dos serviços públicos. O ministro observou que, embora o STJ já tenha aceitado a comunicação via rádio em um caso anterior, isso ocorreu sob a vigência de uma resolução mais antiga da Aneel (Resolução 24/2000), que não continha as mesmas exigências da Resolução 414/2010.
A Resolução 414/2010, em vigor à época dos fatos, determinava que a notificação do corte fosse feita por escrito, com entrega comprovada, ou com destaque na fatura mensal, requisitos que também foram mantidos pela Resolução Normativa 1.000/2021. Assim, o ministro concluiu que a concessionária não pode escolher livremente a forma de comunicar a interrupção do serviço, devendo seguir a forma estabelecida pela agência reguladora.
Questão jurídica envolvida
A principal questão discutida foi a interpretação da Lei 8.987/1995 em conjunto com as normas da Aneel. O STJ entendeu que a concessionária deve obedecer à forma de aviso prévio estabelecida pela Aneel, já que a agência tem o poder normativo para regular os serviços de energia elétrica. O não cumprimento das normas da Aneel configura descumprimento do dever legal de comunicação prévia.
Legislação de referência
Lei 8.987/1995, artigo 6º, parágrafo 3º, inciso I:
“Art. 6º São direitos e obrigações dos usuários:
[…]
§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:
I – motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações.”
Resolução 414/2010 da Aneel, artigo 173, inciso I:
“Art. 173. Para a execução de desligamento programado no sistema de distribuição, a distribuidora deve, no mínimo:
I – comunicar previamente aos consumidores afetados, com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas, em jornal, por correspondência ou outro meio que permita a comprovação do aviso.”
Processo relacionado: REsp 1812140