A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que uma testemunha deverá ser ouvida integralmente em uma ação de assédio sexual movida por uma trabalhadora contra seu empregador. A testemunha também havia movido ação semelhante contra a empresa, mas, segundo a relatora, ministra Maria Helena Mallmann, isso não a torna automaticamente suspeita. A decisão destacou que, em casos de violência sexual, a palavra das vítimas tem um peso probatório especial, dado o caráter velado dessas violações.
Supervisor acusado de assédio durante atividade de trabalho
A trabalhadora, com 18 anos na época dos fatos, alegou que sofria assédio de seu supervisor enquanto realizava atividades que exigiam agachamentos constantes. Segundo seu relato, ele forçava contato físico, e ao resistir, foi ameaçada de que deveria obedecer, pois ele era quem “mandava”. Uma colega confirmou ter vivido situação semelhante.
Após informar o caso à tomadora de serviços e pedir transferência de setor, a trabalhadora foi demitida, sem que houvesse qualquer investigação sobre as acusações. A empresa alegou que a dispensa ocorreu devido ao término da demanda que motivou a contratação temporária.
Defesa da empresa e alegações de imaturidade
A tomadora de serviços negou a existência de assédio sexual, afirmando que a conduta da trabalhadora era “imatura”, natural para alguém em seu primeiro emprego, e não constituía assédio. A empresa também questionou o depoimento de uma testemunha, que confirmou o relato da trabalhadora, alegando que a testemunha tinha uma ação semelhante contra o empregador, o que indicaria troca de favores.
Decisão de primeira instância e recurso ao TST
A juíza de primeira instância considerou a testemunha apenas como informante, atribuindo menor valor ao seu depoimento e julgando improcedente o pedido de indenização por assédio sexual. O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) manteve a decisão, alegando que a testemunha tinha interesse na causa devido à sua própria ação contra a empresa.
Ao analisar o recurso da trabalhadora, a ministra Maria Helena Mallmann citou a Súmula 357 do TST, que afirma que o fato de uma testemunha ter uma ação contra o mesmo empregador não a torna suspeita automaticamente. A ministra criticou a conclusão do TRT, que desconsiderou o contexto do assédio e as dificuldades para provar esse tipo de conduta.
Protocolo de julgamento com perspectiva de gênero
A ministra também ressaltou a importância do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, adotado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), destacando que casos de assédio sexual exigem sensibilidade dos julgadores, uma vez que envolvem dinâmicas de opressão e situações traumáticas para as vítimas.
A Turma decidiu por unanimidade que o processo deve retornar ao TRT para que o depoimento da testemunha seja considerado com pleno valor probatório e que as provas sejam reexaminadas à luz dessa nova análise.
Questão jurídica envolvida
O ponto central do julgamento foi o reconhecimento da importância da palavra das vítimas em casos de assédio sexual, com base na jurisprudência do TST, que afasta suspeitas automáticas sobre testemunhas com ações semelhantes. Além disso, a decisão sublinha a necessidade de uma perspectiva de gênero na análise de casos envolvendo violência sexual no ambiente de trabalho.
Legislação de referência
Súmula 357 do TST:
“O simples fato de a testemunha estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador não a torna suspeita.”
Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (CNJ):
O protocolo visa orientar os magistrados para que considerem as peculiaridades dos casos envolvendo desigualdade de gênero, adotando uma postura sensível às dinâmicas de opressão enfrentadas pelas vítimas.
Processo relacionado: Em sigilo.