Inovar é uma constante humana. A cada dia novos métodos, novos produtos, novos serviços, novos instrumentos e evoluções em tecnologia ocupam os diversos campos da vida.
A inovação pode ocorrer em menos de um dia ou depender de anos de trabalho para dar frutos. Da mesma forma, inovar não equivale apenas a criações tecnológicas, revolucionárias ou de grande complexidade. Antes é apresentar soluções a problemas; atender necessidades; transformar potencialidades e capacidades; resolver contradições.
Fato é que a ação do tempo, por si só, é capaz de alterar a realidade, o que existe. Somente o que é imutável, imóvel, não é alterável à ação do tempo (ADLER, Mortimer J. Como pensar sobre as grandes ideias. trad. Rodrigo Mesquita. São Paulo: É Realizações, 2013, p. 467). Logo, refletirmos sobre a conexão entre o tempo e a inovação relaciona-se, em modo e em espaço, a alterações, movimentos, processos e mudanças, entre as quais identificaremos qual são capazes, de fato, de inovar.
Não se pode fixar um critério quantitativo temporal que integre o conceito de inovação. No entanto, o que marca a inovação no século XXI é uma cultura à instantaneidade. Estamos imersos a hábitos da entrega imediata, de resultados em escala, como nunca experimentado na história da civilização.
E, quando o tempo fica mais rápido, o novo se ordinariza antes. Nas palavras de Byung- Chul Han em seu livro ‘Favor fechar os olhos: em busca de um outro tempo’, o presente se reduziu à ponta da atualidade e estamos perdendo partes de sua duração. Surge, por isso, um impasse entre o tempo de expetativa à entrega e o tempo necessário aos processos de inovação.
O ponto de partida é considerar que as inovações não representam algo que iniciamos ontem, ano passado, nas mais recentes décadas passadas. Usufruímos a herança de mentes inovadoras ao longo de séculos. Toda inovação carrega consigo, por isso, a soma do que vivemos em cada período do tempo, de cada ciclo revolucionário da história.
Então, como podemos compreender a medida de tempo necessária à inovação?
A pergunta não objetiva tratar os estágios para que uma invenção se torne uma inovação autêntica e difusa. Tampouco recuperar a teoria dos ciclos[1] de inovação de Joseph A. Schumpeter. O intuito é expandir a ideia cotidiana sobre a necessidade de conciliar diferentes frentes de trabalho em inovação quanto ao tempo de entrega.
Mais importante do pensar sobre o espaço da inovação, sobre o modo como trazer o novo à existência concreta, é primordial termos clareza quanto fato de que o tempo para a inovação é variável. Essa variação é saudável, inclusiva e permeia o processo inventivo com flexibilidade e visão gerencial de soluções. Trabalhar com tempos diversos de concretização da inovação permite endereçá-la a desafios de todas as ordens, desde os mais complexos até os mais simples, todos igualmente necessários, mas sem que uns sejam frequentemente diferidos por outros somente por não terem entregas de curto prazo a oferecer.
Os laboratórios de inovação são ambientes nos quais se equilibra, constantemente, a abstração e a realidade (FERRAREZI, Elisabete; ALMEIDA, Guilherme Almeida de. Laboratório de inovação pública: como e por que criá-los. Brasília: ENAP, 2023, p. 116). Gerar inovação é trabalhar com metodologias e abordagens diferentes, cada qual com sua forma de consideração de tempo. Haverá problemas de maior complexidade para os quais não há solução pronta ou ideal (os chamados wicked problems). Como também há resoluções aptas a abordagens mais ágeis, informais e de curto prazo (Ferrarezi, 2023, p. 143-149).
Sob o ponto de vista da gestão do tempo e da estratégia ao desenvolvimento de produtos, serviços, soluções, metodologias inovadoras, é preciso dimensionar as forças das equipes conforme cada caso. Há experimentos que demandam mais tempo, outros terão sua execução menos diferida no tempo. Alguns testarão mais vezes. Outros não. Esses critérios repercutem no dimensionamento real do planejamento, na alocação de recursos financeiros e humanos, no desenvolvimento do projeto, projeções, nas entregas e na matriz de risco.
Existem inovações que dependem de um curto prazo de idealização, desenvolvimento e execução. Outras serão de médio prazo. Como também haverá projetos que exigirão trabalhos de longo prazo. Cada inovação é um processo individual e como tal terá sua própria medida de tempo a ser analisada. Isso não significa dizer que a previsibilidade e a avaliação de riscos quanto ao tempo de conclusão de um projeto sejam itens secundários ou dispensáveis. Significa que um laboratório de inovação precisa abarcar projetos em diferentes escalas de tempo quanto ao resultado.
Sugere-se, pois, uma pergunta mais ajustada à relação do tempo com a inovação: quais propostas são de curto, médio ou longo prazo? Todos esses formatos interessam à inovação e a interação dialética entre eles oferece oportunidades de aprimoramento, de prospecção e de co-criação sistêmicas.
Em Laboratórios de Inovação, em que se prima pela atuação em rede, articulados, multiparticipativos e de aproximação entre áreas diversas, é recomendável que sejam considerados projetos em todas as categorias de tempo, com adoção de parâmetros flexíveis ao tempo de desenvolvimento versus tempo de entrega. Será essa visão integrativa e de quantificação variável de tempo à inovação que trará uma percepção mais madura, apurada e ampla à gestão sobre o inovar. Adotar-se-á, assim, uma forma de tomada de decisões estratégica afastada do binário “ação-reação”. A partir do momento em que, na velocidade desafiadora e disruptiva do século XXI, for possível refletirmos sobre a potencialidade de cada tempo de colheita de frutos inovadores, sem ceticismo frente a problemas mais complexos da vida humana e das organizações, serão edificadas soluções mais sólidas e mantida a liderança humana para a essência inventiva na arte de inovar.
Texto publicado originalmente na página do Laboratório de Inovação da Advocacia-Geral da União (Labori-AGU).
[1] Para os ciclos de vida de laboratórios de inovação pública, recomenda-se a consulta: Werneck, Caio et al. Ciclos de vida de laboratórios de inovação pública. Brasília: Enap, 2020.
Sobre o autor:
Procuradora Federal. Atua no contencioso prioritário finalístico e no Laboratório de Inovação da AGU (Labori). Autora do livro “Regras de boas práticas e governança em privacidade na LGPD: conceitos, controles e projeções.” Mestre em Direito Administrativo pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Especialista Direito Público. MBA Relações Internacionais. Co-autora de livros. Co-editora de revistas jurídicas.