O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou, em decisão com repercussão geral, que é inconstitucional o uso de recursos públicos para promover celebrações relacionadas ao golpe militar de 1964. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1429329, finalizado em 6 de setembro. O entendimento, agora aplicado a todos os casos semelhantes em tramitação, reforça que tais comemorações representam uma afronta à Constituição e ao patrimônio imaterial da União.
Contexto do caso
O julgamento teve origem em uma ação popular movida contra a “Ordem do Dia Alusiva ao 31 de Março de 1964”, editada pelo Ministério da Defesa em 2020. O documento, publicado em comemoração aos 56 anos do golpe militar, foi questionado por veicular uma mensagem de exaltação ao evento. A primeira instância determinou a retirada da mensagem, mas o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) reverteu a decisão, argumentando que a ordem expressava uma visão histórica das Forças Armadas, o que seria permitido pela Constituição.
Contudo, a deputada federal Natália Bonavides (PT/RN) recorreu ao STF, alegando que a celebração de um golpe de Estado fere princípios constitucionais, como a moralidade, a segurança e a saúde pública, além de desrespeitar a memória das vítimas do regime militar.
Entendimento do STF
No voto vencedor, o ministro Gilmar Mendes ressaltou que a utilização de recursos públicos para comemorar o golpe de 1964 é inconstitucional e prejudicial ao patrimônio imaterial da União. Ele destacou que a ordem democrática estabelecida pela Constituição de 1988 não admite o enaltecimento de golpes militares ou de qualquer ato que promova a subversão da ordem legítima.
O ministro sublinhou que os agentes públicos, ao se comunicarem em nome do Estado, devem respeitar os princípios constitucionais da administração pública. Mendes também associou essas práticas à tendência de contestações inconstitucionais da ordem democrática, mencionando os eventos de 8 de janeiro de 2023 como parte desse contexto maior.
Divergências
Os ministros Nunes Marques, relator original do caso, Dias Toffoli e André Mendonça, votaram contra a repercussão geral do tema, mas foram vencidos pelo restante do Plenário.
Tese de repercussão geral
O STF firmou a seguinte tese de repercussão geral:
“A utilização, por qualquer ente estatal, de recursos públicos para promover comemorações alusivas ao Golpe de 1964 atenta contra a Constituição e consiste em ato lesivo ao patrimônio imaterial da União.”
Questão jurídica envolvida
A decisão reforça o entendimento de que é inconstitucional o uso de recursos públicos para celebrar eventos que atentam contra a ordem democrática, como o golpe militar de 1964. A ação se baseia nos princípios constitucionais que protegem o patrimônio imaterial da União e garantem a moralidade administrativa.
Legislação de referência
- Constituição Federal de 1988, Artigo 37:
“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.” - Lei 4.717/1965:
Regula a ação popular, instrumento utilizado para a defesa de direitos difusos, como a moralidade administrativa.
Processo relacionado: RE 1429329