Criança com autismo em situação de vulnerabilidade obtém benefício assistencial à pessoa com deficiência

Decisão determina ao INSS pagamento de benefício e parcelas atrasadas após negativa inicial por critério de renda familiar

A 2ª Vara Federal de Carazinho (RS) determinou que um menino de quatro anos, diagnosticado com autismo nível 3, tenha direito ao benefício de amparo assistencial à pessoa com deficiência. A decisão, assinada pelo juiz Lademiro Dors Filho, considerou as condições de vulnerabilidade social e econômica da família, que reside em Sarandi (RS). A sentença foi publicada em 10 de setembro e cabe recurso às Turmas Recursais.

Os pais da criança ingressaram com ação judicial após o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) negar o benefício com base na renda familiar, que ultrapassava o limite estabelecido de 1/4 do salário mínimo per capita. O pedido inicial havia sido feito em novembro de 2022, mas foi recusado.

O conceito de deficiência e vulnerabilidade social

O benefício assistencial está previsto na Constituição Federal, garantindo um salário mínimo mensal ao idoso ou à pessoa com deficiência que não tenha condições de prover a própria manutenção, nem a família tenha meios de sustentar. O juiz destacou o conceito de deficiência baseado na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao Direito brasileiro. Segundo o magistrado, a deficiência deve ser vista como um fenômeno social, resultante da interação entre as limitações pessoais e o ambiente social, sendo amplificada quando a sociedade e o ambiente não oferecem condições adequadas para a participação plena.

No caso, duas perícias foram realizadas para confirmar o quadro da criança. Uma médica, conduzida por neurologista, atestou o diagnóstico de autismo infantil, preenchendo o requisito de deficiência necessário para o recebimento do benefício. O diagnóstico foi feito em outubro de 2022.

Análise da renda e condições de vulnerabilidade

Para o juiz, a questão central passou a ser a comprovação da miserabilidade. A Lei brasileira estabelece como critério objetivo uma renda familiar per capita de até 1/4 do salário mínimo. No entanto, o magistrado ressaltou que os tribunais superiores têm flexibilizado esse critério, reconhecendo que a vulnerabilidade social deve ser avaliada caso a caso.

A perícia socioeconômica demonstrou que a mãe da criança trabalha como faxineira e tem uma renda mensal de R$ 806,00, enquanto o pai recebe auxílio-acidente de R$ 706,00 e seguro-desemprego de R$ 1.412,00. O orçamento familiar é impactado por despesas fixas de aproximadamente R$ 2.578,87, incluindo alimentação, contas básicas, medicamentos e consultas médicas.

A assistente social também apontou as dificuldades enfrentadas pela família, como os desafios de obter tratamento adequado no Sistema Único de Saúde (SUS) e os gastos com medicação e médicos particulares. A criança ainda não desenvolveu a fala, depende de supervisão integral e enfrenta dificuldades de socialização, o que agrava a condição familiar.

A decisão judicial

Diante dos fatos, o juiz concluiu que a renda familiar é insuficiente para manter o desenvolvimento adequado da criança, caracterizando a vulnerabilidade social da família. Ele enfatizou o dever constitucional do Estado de proteger a família, conforme previsto no artigo 226 da Constituição Federal, que garante proteção preferencial à criança.

A sentença julgou procedente o pedido e determinou ao INSS a concessão do benefício assistencial, além do pagamento das parcelas atrasadas desde o pedido inicial. Ainda cabe recurso da decisão.

Questão jurídica envolvida

O caso trata da concessão do benefício de prestação continuada (BPC) previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, destinado a pessoas com deficiência e idosos sem meios de prover a própria subsistência. A decisão envolve a interpretação flexível dos critérios de renda per capita familiar, conforme entendimento consolidado pelos tribunais superiores.

Legislação de referência

  • Art. 203, inciso V, da Constituição Federal: “A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: […] V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”
  • Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social): Regula o Benefício de Prestação Continuada e seus critérios.
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