A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, sob o rito do Incidente de Assunção de Competência (IAC 7), que a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que rejeitou pedidos de reversão da privatização da Companhia Vale do Rio Doce (atualmente, Vale S.A.), realizada em 1997, tem efeito erga omnes, ou seja, se aplica a todas as ações populares sobre o mesmo tema. A tese consolidada pelo STJ estabelece que a superveniência de decisão transitada em julgado em uma das ações populares deve ser oponível a todas as demais, conforme o artigo 18 da Lei 4.717/1965.
Teoria do fato consumado impede reversão da privatização
O TRF1 utilizou a teoria do fato consumado para justificar que a privatização da Vale já havia produzido efeitos irreversíveis e que seria “desastroso” para o Judiciário tentar anular a operação, considerando as mudanças que ocorreram desde então. Mesmo após essa decisão, diversas ações populares continuaram tramitando em outras regiões do país, alegando, entre outros aspectos, lesão ao erário por subavaliação da empresa.
STJ unifica as ações na Justiça Federal do Pará
O relator do IAC 7, ministro Mauro Campbell Marques, lembrou que os questionamentos sobre a privatização da Vale começaram no próprio ano de 1997, quando a companhia foi leiloada. Naquela época, a Primeira Seção do STJ decidiu pela centralização das primeiras 27 ações populares na Justiça Federal do Pará, em função da conexão entre os casos. O STJ reconheceu que, embora as ações não fossem idênticas, havia semelhança nos temas litigiosos, todos relacionados à anulação ou impedimento da privatização.
No entanto, ao longo dos anos, o TRF1 acabou proferindo decisões divergentes em ações semelhantes, aplicando o fato consumado em alguns casos, enquanto em outros, permitiu a produção de novas provas. Isso gerou conflitos judiciais, levando à intervenção do STJ para unificar as decisões.
Ação popular e legitimidade coletiva
O ministro Campbell enfatizou que o autor de uma ação popular não é o titular exclusivo do bem jurídico em questão, mas age em nome de toda a sociedade. Assim, a decisão proferida em uma ação popular tem efeito erga omnes, ou seja, deve ser aplicada a todas as ações com o mesmo objeto litigioso. Ele ressaltou que permitir decisões divergentes em casos semelhantes geraria insegurança jurídica e ofenderia o artigo 18 da Lei 4.717/1965.
Questão jurídica envolvida
A decisão reafirma a importância da uniformidade em julgamentos de ações populares, especialmente em casos de grande repercussão, como a privatização de empresas estatais. O STJ consolidou o entendimento de que a sentença que rejeitou os pedidos de reversão da privatização da Vale se aplica a todas as ações populares sobre o tema, evitando decisões inconciliáveis.
Legislação de referência
- Artigo 18 da Lei 4.717/1965 (Lei da Ação Popular):
“A sentença que concluir pela carência ou improcedência da ação popular produzirá coisa julgada secundum eventum litis, somente em relação ao autor da demanda, salvo se o pedido for julgado procedente, quando a eficácia será erga omnes.” - Artigo 103 da Constituição Federal:
“São admitidas as ações populares que visem a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe.”
Processo relacionado: REsp 1806016, REsp 1806608