STF decide pela permanência de 3 crianças no Brasil para tratamento médico especializado

Primeira Turma do STF reconhece excepcionalidade do caso, considerando gravidade do estado de saúde de uma das crianças

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que três crianças que residiam na Colômbia devem permanecer no Brasil sob a guarda da mãe. A decisão foi tomada durante o julgamento do Habeas Corpus (HC) 242623, realizado na terça-feira, 27 de agosto. As crianças estão no Brasil há quatro anos, período em que uma delas, com paralisia cerebral e tetraplegia, recebeu tratamento médico.

Contexto familiar e de saúde

O pai, paraguaio, a mãe, brasileira, e os três filhos (dois nascidos no Brasil e um nos Estados Unidos), atualmente com 8, 10 e 11 anos, viviam em Barranquilla, na Colômbia. Em setembro de 2020, a mãe e R.B.P.D., o filho com paralisia, viajaram ao Rio de Janeiro para exames médicos e continuidade do tratamento realizado no Brasil desde o nascimento do menino. O pai e os outros filhos viajaram ao Brasil para as festas de fim de ano, mas após uma cirurgia do filho com paralisia, a mãe decidiu que os irmãos deveriam permanecer no Brasil, enquanto o pai retornou à Colômbia. Em 2021, a mãe obteve a guarda das crianças.

Questionamento da decisão do STJ

No STF, a defesa da mãe contestou uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, seguindo entendimentos das instâncias inferiores, ordenou o retorno imediato das crianças para a residência familiar na Colômbia. O STJ concluiu que o caso não se configurava como uma exceção à regra da Convenção da Haia, que visa garantir o retorno imediato de crianças e adolescentes transferidos ilicitamente para outro país.

Argumentos da defesa no STF

A defesa argumentou que a Convenção da Haia deveria ser interpretada em conjunto com outras normas, considerando o bem-estar das crianças. Destacaram que as crianças estão adaptadas ao Brasil, têm suporte da família materna no Rio de Janeiro e que o pai não estaria preparado para recebê-las. Também foi argumentado que o filho com paralisia cerebral recebe no Brasil os melhores tratamentos e que a viagem para a Colômbia poderia representar risco de morte, devido às crises convulsivas diárias do menino.

Melhor interesse das crianças

A Primeira Turma do STF acompanhou o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, que defendeu que a permanência no Brasil está alinhada com o melhor interesse das crianças. Ela enfatizou que, apesar da regra geral da Convenção da Haia de entrega imediata das crianças, os interesses dos menores devem orientar a interpretação e aplicação da norma, respeitando estritamente os direitos fundamentais, a dignidade humana, o direito à vida e à proteção integral.

A ministra Cármen Lúcia destacou a gravidade e complexidade do caso, afirmando que “as crianças são pessoas, e não coisas que se disputam como se pudessem ser entregues, devolvidas, restituídas por conveniências de adultos”. Ela enfatizou que as disputas entre adultos devem ser resolvidas entre eles, sem que as crianças sejam afetadas.

Exceção prevista na Convenção da Haia

O ministro Cristiano Zanin, ao seguir o voto da relatora, ressaltou que o artigo 13 da Convenção da Haia permite exceções à entrega imediata das crianças, e que tais exceções são aplicáveis ao caso em questão.

Questões de direito de família

Os ministros da Primeira Turma também reforçaram que outras questões relacionadas ao direito de família deverão ser julgadas pelas instâncias competentes, conforme as leis aplicáveis.

Questão jurídica envolvida

A decisão do STF reflete a interpretação excepcional das regras da Convenção da Haia à luz dos direitos fundamentais das crianças, priorizando seu melhor interesse e o respeito à dignidade humana, especialmente em contextos de saúde grave e adaptações emocionais e sociais significativas.

Legislação de referência

Convenção da Haia sobre Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças: “Art. 13 – Não obstante o disposto no artigo anterior, a autoridade judicial ou administrativa do Estado requerido não é obrigada a ordenar o retorno da criança se a pessoa, instituição ou outro organismo que se oponha ao seu retorno provar que: (…) b) há um risco grave de que o retorno da criança a sujeite a perigo físico ou psicológico ou, de qualquer forma, coloque a criança em situação intolerável.”

Processo relacionado: HC 242623

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