A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que cabe ao juízo da execução fiscal determinar o bloqueio de valores pertencentes a uma empresa em recuperação judicial. A decisão foi tomada ao analisar um conflito de competência entre o juízo de direito da 20ª Vara Cível de Recife e o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5).
Contexto do caso
Após a aprovação e homologação do seu plano de recuperação judicial, uma empresa tornou-se ré em execução fiscal movida pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), que busca recuperar uma dívida de aproximadamente R$ 30 milhões. Esta dívida está sendo discutida em uma ação anulatória na 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal. Apesar da discussão sobre a existência da dívida, o juízo da 33ª Seção Judiciária Federal de Pernambuco prosseguiu com os atos executivos e bloqueou cerca de R$ 60 mil em conta bancária. A empresa solicitou ao juízo da recuperação judicial uma tutela de urgência, que deferiu liminar para desbloquear o valor e solicitou ao administrador a indicação de outros bens em substituição. O DNIT recorreu ao TRF5, que acatou o agravo de instrumento.
Argumentos no STJ
No STJ, a empresa argumentou que o juízo da recuperação judicial teria competência exclusiva para decidir sobre disputas envolvendo seu patrimônio, especialmente em atos constritivos que poderiam inviabilizar suas operações.
Interpretação do artigo 6º, parágrafo 7º-B, da Lei 11.101/2005
O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator do processo, destacou que o artigo 6º, parágrafo 7º-B, da Lei 11.101/2005, introduzido pela Lei 14.112/2020, limita a competência do juízo da recuperação judicial para substituir atos de constrição sobre bens de capital essenciais até o encerramento da recuperação. Esses bens devem ser corpóreos, móveis ou imóveis, não perecíveis ou consumíveis, e empregados no processo produtivo da empresa.
Preservação da atividade econômica
O ministro ressaltou que a Lei 14.112/2020 busca equilibrar o tratamento do débito tributário, preservando a atividade econômica que gera empregos e impostos. A lei incentiva a adesão ao parcelamento de crédito tributário, dispensando a apresentação de certidões negativas de débitos tributários.
Bloqueio de valores não é ato de constrição sobre bens de capital
Cueva argumentou que valores em dinheiro não constituem bens de capital e, portanto, o juízo da recuperação judicial não tem competência para determinar a substituição dos atos de constrição. Assim, a competência para o bloqueio dos valores pertence ao juízo da 33ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco e ao TRF5 em âmbito recursal.
Questão jurídica envolvida
A questão central trata da interpretação do artigo 6º, parágrafo 7º-B, da Lei 11.101/2005, que limita a competência do juízo da recuperação judicial sobre atos de constrição de bens de capital essenciais, e a definição de competência para atos de bloqueio de valores durante o processo de execução fiscal.
Legislação de referência
Lei 11.101/2005, Art. 6º, parágrafo 7º-B: “O juiz da recuperação judicial poderá substituir atos de constrição sobre bens de capital essenciais à atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial.”
Lei 14.112/2020: “Modifica dispositivos da Lei 11.101/2005 para aperfeiçoar a legislação sobre recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência do empresário e da sociedade empresária.”
Constituição Federal, Art. 170: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.”
Processo relacionado: CC 166.334