Na sessão plenária de 5 de junho de 2024, o Tribunal de Contas da União (TCU) analisou uma consulta do Ministério da Agricultura e Pecuária sobre a possibilidade de inscrição em restos a pagar de valores decorrentes de emenda parlamentar impositiva, empenhados sem a celebração do respectivo contrato administrativo. A consulta também questionava a possibilidade de postergar a formalização desses contratos para o exercício financeiro subsequente ao empenho dos valores.
Análise do TCU
O relator, ministro-substituto Augusto Sherman Cavalcanti, destacou que, apesar de o princípio da anualidade orçamentária poder resultar na perda de dotações ao final do exercício financeiro, os benefícios práticos superam esse efeito negativo. Ele enfatizou o fortalecimento do controle parlamentar sobre o orçamento, a melhoria na eficiência da alocação das dotações orçamentárias e a simplificação no processo de elaboração do orçamento.
O relator argumentou que os riscos de perda de dotação podem ser mitigados por um planejamento adequado das ações a serem executadas ao longo do exercício. Ele observou que, conforme manifestações de órgãos como a Secretaria do Tesouro Nacional, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a Secretaria de Orçamento Federal e a Advocacia-Geral da União, a prática de inscrever empenhos em restos a pagar sem a correspondente formalização do contrato administrativo viola o princípio da anualidade orçamentária.
Conclusões e recomendações
O ministro-substituto Sherman Cavalcanti afirmou que a criação de exceções ao princípio da anualidade não é adequada para evitar a perda de dotações ao final de um exercício. Ele reforçou que não há amparo legal para empenhar, em um exercício, despesa que será executada em outro, independentemente de a dotação orçamentária ser proveniente de emenda parlamentar impositiva.
A execução da despesa deve ocorrer durante o exercício financeiro da dotação orçamentária, respeitando os estágios de empenho, liquidação e pagamento. O uso de restos a pagar para evitar a expiração de créditos orçamentários não encontra amparo legal e pode comprometer a eficiência na gestão dos recursos públicos. Qualquer flexibilização da anualidade orçamentária deve ser reservada ao Congresso Nacional, não cabendo ao TCU criar exceções às disposições legais e constitucionais.
Resposta à consulta
O TCU respondeu ao Ministério da Agricultura e Pecuária afirmando que:
- A inscrição de notas de empenho em restos a pagar, mesmo com dotação orçamentária de emenda parlamentar impositiva, deve cumprir os requisitos legais, especialmente o art. 35 do Decreto 93.872/1986, não sendo permitido realizar empenhos apenas para evitar que os créditos orçamentários expirem ao final do exercício.
- A celebração de contrato administrativo exige a indicação do crédito orçamentário pelo qual a despesa será paga, conforme o art. 92, inciso VIII, da Lei 14.133/2021.
- Novas licitações ou contratações de remanescente de obra, serviço ou fornecimento, em caso de fracasso da licitação anterior ou rescisão contratual, podem ser realizadas utilizando saldos a liquidar de despesas empenhadas ou em restos a pagar não processados, conforme os arts. 90, §§ 8º e 9º, da Lei 14.133/2021.
Para mais informações, recomenda-se a leitura do Acórdão 1106/2024-TCU-Plenário e do voto do relator, Ministro-Substituto Augusto Sherman Cavalcanti.
Legislação de referência
- Art. 35 do Decreto 93.872/1986: “A inscrição dos restos a pagar processados far-se-á pelo saldo não pago das notas de empenho devidamente processadas até 31 de dezembro do exercício a que se refiram.”
- Art. 92, inciso VIII, da Lei 14.133/2021: “É vedado o empenho de despesa que não tenha sido objeto de contratação formal.”
Processo relacionado: TC 019.695/2023-3