A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é inadmissível a utilização de provas obtidas a partir de acordo de colaboração premiada firmado com violação do sigilo profissional de advogado. Com essa decisão, foi anulada a colaboração do advogado Sacha Reck, bem como as provas e denúncias decorrentes, em uma ação penal contra a empresa de transportes coletivos Pérola do Oeste, para a qual Reck trabalhava.
Investigação do MPPR
A empresa foi alvo de uma investigação do Ministério Público do Paraná (MPPR), que buscava apurar uma possível associação criminosa voltada à fraude de licitações para concessão de serviços públicos de transporte no estado. O advogado Sacha Breckenfeld Reck, um dos investigados, firmou um acordo de colaboração com o MPPR após ser denunciado e preso em 1º de julho de 2016. Esse acordo, firmado entre 6 de julho e 8 de agosto de 2016, resultou em novas investigações e no aditamento da denúncia em março de 2017, incluindo dois ex-administradores da empresa.
Sigilo profissional e direito de defesa
Para o relator do caso, ministro Sebastião Reis Junior, o sigilo profissional do advogado não pode ser quebrado, mesmo quando ele é investigado. “Esse ônus do advogado não pode ser superado mesmo quando investigado, sob pena de se colocar em fragilidade o amplo direito de defesa”, afirmou o ministro.
Delatados podem questionar acordos
O ministro Sebastião Reis Junior destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF) admite que terceiros, como os delatados, possam questionar a validade de acordos de colaboração premiada. “A partir do momento em que sua esfera jurídica foi afetada pelo teor da delação, é evidente a sua legitimidade para questionar esse acordo, que, de forma negativa, afeta direitos seus”, explicou o ministro.
Limites do sigilo profissional
Segundo o relator, a quebra do sigilo profissional para atenuar a pena do próprio advogado não é autorizada pelo Código de Ética da Advocacia, exceto em casos de grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado é afrontado pelo cliente. O artigo 4º da Lei 12.850/2013, que trata da colaboração premiada, não se aplica nessas situações.
Precedentes e decisões recentes
O ministro também mencionou uma decisão recente da Quinta Turma, que em um caso semelhante, considerou ilegal a conduta de um advogado que delatou a empresa para a qual prestava serviços sem ser alvo de investigação. O relator desse caso, ministro João Otávio de Noronha, enfatizou que o sigilo profissional é essencial para o direito de defesa e para a relação de confiança entre advogado e cliente.
Divergência no julgamento
O ministro Rogerio Schietti Cruz apresentou um voto divergente, afirmando que é necessário separar a conduta do colaborador em dois momentos: antes e depois de sua suposta participação ativa na organização criminosa. Schietti argumentou que o sigilo profissional não pode proteger advogados que participam ativamente de crimes.
Questão jurídica envolvida
A decisão trata da proteção do sigilo profissional do advogado e a inadmissibilidade de provas obtidas por meio de colaboração premiada que viole essa confidencialidade. O entendimento é que o sigilo profissional é essencial para garantir o amplo direito de defesa e a confiança na relação entre advogado e cliente.
Legislação de referência
Constituição Federal – Art. 133: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”
Lei 12.850/2013 – Art. 4º: “O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder perdão judicial ao colaborador, reduzir em até 2/3 (dois terços) sua pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos se a colaboração premiada for efetiva e voluntária.”
Código de Ética da Advocacia – Art. 25: “O sigilo profissional é inerente à profissão de advogado, sendo sua violação considerado infração disciplinar grave.”
Processo relacionado: RHC 141.377