A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2597/2024, conhecido como marco legal dos seguros, que reformula as normas do setor e estabelece limitações importantes, como a proibição de cláusulas que permitam a extinção unilateral do contrato pela seguradora, exceto em situações específicas previstas em lei. A proposta agora segue para sanção presidencial
Principais pontos do projeto
O texto aprovado, substitutivo do Senado ao projeto de autoria do ex-deputado José Eduardo Cardozo, teve parecer favorável do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG). Entre as principais regras, o texto determina que o segurado não deve aumentar intencionalmente o risco coberto pelo seguro de maneira relevante, sob pena de perder a garantia contratual
Para evitar insegurança jurídica, o projeto define que os riscos e interesses excluídos da cobertura devem ser descritos de forma clara. Além disso, caso haja divergência entre a garantia delimitada no contrato e a prevista nos modelos de contrato ou nas notas técnicas da seguradora apresentadas ao órgão fiscalizador, prevalecerá o texto mais favorável ao segurado
Quando uma seguradora cobre diferentes interesses e riscos, os requisitos para cada um devem ser estabelecidos separadamente, de modo que a nulidade de um não afete os demais
O contrato será considerado nulo se, no momento de sua celebração, qualquer das partes souber que o risco é impossível ou já se realizou. Nesse caso, a parte que assinou o contrato mesmo sabendo dessa condição deverá pagar à outra o dobro do valor do prêmio
Impacto no setor de seguros
Reginaldo Lopes afirmou que o novo marco legal dos seguros é parte de uma agenda de reformas microeconômicas que busca aumentar a capacidade de crescimento econômico sem pressionar a inflação. Ele mencionou que, com essas mudanças, o setor de seguros pode expandir sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) de 6% para 10% até 2030. Segundo Lopes, “todos ganham com essas alterações, a sociedade e o setor de seguros, o que é positivo para a retomada do crescimento econômico brasileiro”. Ele destacou que atualmente há baixa penetração de seguros no Brasil, com apenas dois em cada dez carros segurados e menos de 15% de proteção residencial
Mudanças relacionadas ao risco
Em casos de aumento relevante do risco previamente calculado e se o aumento do prêmio recalculado for superior a 10%, o segurado poderá recusar o reajuste e solicitar a dissolução do contrato em até 15 dias a partir da notificação. A eficácia da revogação retroagirá ao momento em que o risco foi agravado. Se ocorrer um sinistro nesse período, a seguradora só poderá recusar a indenização se comprovar a relação causal entre o agravamento do risco e o sinistro
Debates no Plenário
Durante a votação, a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) elogiou o projeto por abrir perspectivas para a modernização do setor, enquanto o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) criticou as alterações feitas pelo Senado, alegando que favorecem mais as seguradoras que os segurados. Ele afirmou que “o questionário de avaliação de risco favorece unilateralmente as seguradoras”
O deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB) também expressou preocupação, afirmando que as mudanças podem engessar o mercado. Já o deputado Gilson Marques (NOVO-SC) considerou que a proposta cria uma reserva de mercado
Alterações no seguro de vida
O texto aprovado revoga trechos do Código Civil relacionados ao seguro de vida e danos, incorporando novas disposições e detalhando outras. O proponente do seguro poderá estipular livremente o valor do capital segurado, tanto para o prêmio quanto para o capital em caso de sinistro. A indicação de beneficiários é livre e pode ser alterada por declaração de última vontade do falecido, mas, caso a seguradora não seja informada a tempo sobre a substituição, não será responsabilizada se efetuar o pagamento ao beneficiário anterior. Se a seguradora não identificar beneficiário ou dependente em até três anos após a morte do segurado, o capital será considerado abandonado e destinado ao Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap)
Carência, suicídio e doenças preexistentes
O projeto proíbe a exigência de carência para renovações ou substituições de contratos existentes, mesmo que seja com outra seguradora. O prazo de carência, em qualquer situação, não pode tornar a garantia inócua nem ser superior à metade da vigência do contrato
No que diz respeito a doenças preexistentes, a seguradora só poderá excluir a garantia se não houver prazo de carência pactuado e se o segurado omitiu voluntariamente a informação após questionamento claro. Em caso de carência estipulada, a seguradora não poderá negar o pagamento sob alegação de doença preexistente
A exclusão do pagamento por suicídio ocorrido dentro de dois anos da vigência do seguro permanece, mas em casos de grave ameaça ou legítima defesa, o pagamento não poderá ser negado
Questão jurídica envolvida
A aprovação do Projeto de Lei 2597/2024 representa uma reforma significativa no Direito Civil brasileiro, especialmente nas normas que regulam os contratos de seguro. A proposta busca equilibrar as relações entre seguradoras e segurados, garantindo maior proteção ao consumidor e estabelecendo diretrizes claras para a interpretação e execução dos contratos de seguro
Legislação de referência
- Projeto de Lei 2597/2024: Dispõe sobre o contrato de seguro e dá outras providências
- Código Civil (Lei 10.406/2002)
- Artigo 757: Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados
- Artigo 760: A apólice ou bilhete de seguro conterá os riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido pelo segurado
- Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap): Instrumento legal para financiamento de ações de defesa civil