O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por decisão monocrática do Ministro Rogério Schietti Cruz, concedeu habeas corpus para absolver um réu condenado por tráfico de drogas. A decisão considerou ilícitas as provas obtidas após confissão informal realizada em condições que indicavam coação policial.
A Turma reconheceu que o ônus da prova quanto à legalidade da atuação policial recai sobre o Estado. Diante da verossimilhança das alegações de tortura e da ausência de registros da abordagem e da entrada domiciliar, a Corte concluiu pela nulidade da confissão e, por derivação, das demais provas.
Contexto da decisão
O caso envolveu a condenação de um jovem por tráfico de drogas, fundamentada principalmente em sua confissão informal prestada após abordagem policial. Apesar de não terem sido encontradas substâncias ilícitas com o acusado no momento da busca pessoal, a condenação se deu com base em sua indicação de que as drogas estavam na residência de sua então namorada.
A gravação da confissão, realizada pelos próprios policiais, mostrava o acusado em um ambiente escuro, sentado no chão com as mãos escondidas, respondendo afirmativamente a perguntas sugestivas. A versão policial foi acolhida sem ressalvas pelas instâncias ordinárias, mesmo diante de laudo pericial que indicava fratura em seu dedo e alegações consistentes de maus-tratos feitas desde a audiência de custódia.
Fundamentos jurídicos do julgamento
O Ministro relator ressaltou que, diante de suspeitas fundadas de violência, compete ao Estado demonstrar a regularidade da atuação policial. A decisão baseou-se no princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas e de suas derivadas, conforme previsto no artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal.
Além disso, a decisão faz referência à doutrina especializada e aos Princípios Méndez, recomendados pela ONU, que tratam da obtenção de confissões confiáveis e do combate à tortura e maus-tratos em ambientes de investigação.
Impactos práticos da decisão
A decisão reitera a importância do controle judicial sobre a produção de provas penais e reforça o papel garantidor do processo penal. O entendimento adotado pode impactar casos similares em que confissões obtidas de forma informal, sem salvaguardas institucionais, são utilizadas como principais elementos de prova.
Além disso, destaca-se o papel da gravação audiovisual não como mero registro, mas como prova a ser avaliada de forma crítica, especialmente quando envolvem suspeitas de violação de direitos fundamentais.
Legislação de referência
Constituição Federal de 1988
Art. 5º, inciso XI: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
Art. 5º, inciso LVI: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.
Lei 11.343/2006
Art. 33, caput: “importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.
Art. 35, caput: “associar-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei”.
Princípios sobre Entrevistas Eficazes para Investigação e Coleta de Informações (Princípios Méndez)
Trecho: “O risco de tratamento ilícito e desumano é particularmente elevado no momento da apreensão ou detenção…”.
Processo relacionado: Habeas Corpus 915025