O presente trabalho busca demonstrar a obrigatoriedade da consolidação da legislação tributária em um único documento, como forma de garantir a eficiência, publicidade e transparência das regras que regem as relações tributárias entre o Estado e os cidadãos.
Inicialmente, é necessário destacar que a obrigatoriedade de consolidação periódica da legislação decorre dos princípios da eficiência, publicidade, transparência, moralidade e boa-fé objetiva, além da previsão legal específica.
Sobre os princípios, o Professor Paulo Bonavides, citando Joaquín Arces Flórez-Valdéz, afirma que eles são uma “superfonte” do Direito[1]. Sendo assim, os princípios aplicam-se à obrigatoriedade da consolidação das normas.
Em relação ao princípio da eficiência, previsto no art. 37 da Constituição, como norteador da atuação da administração pública, o professor José Afonso da Silva afirma que ele orienta a atividade administrativa para alcançar os melhores resultados com os meios limitados disponíveis e ao menor custo, ou seja, obter o maior benefício com o menor gasto. Tem, portanto, como conteúdo essencial a relação entre meios e resultados.[2]
No âmbito da consolidação da legislação tributária, o princípio da eficiência está relacionado tanto com a atuação da administração pública quanto com o esclarecimento dos cidadãos sobre as normas de natureza tributárias vigentes. É um meio para atingir os melhores resultados, com o menor custo possível, promovendo um sistema tributário eficiente para o Estado e justo para os cidadãos.
Também previsto no art. 37 da Constituição, o princípio da publicidade, que, segundo o professor José Afonso da Silva, exige que a administração atue com a maior transparência possível.[3] Na esfera da consolidação da legislação tributária, o princípio da publicidade impõe ao Estado a obrigação de dar conhecimento às normas tributárias em vigor.
O princípio da transparência, por sua vez, é um desdobramento do princípio da publicidade, exigindo que a atuação seja clara, precisa e acessível, tornando as decisões, regras e demais informações visíveis à população. Na consolidação da legislação tributária, o princípio da transparência obriga a administração pública a agir de forma clara, precisa e acessível, proporcionando visibilidade a todas as regras que regem as relações tributárias.
Ainda no campo dos princípios, também presente no art. 37 da Constituição, o princípio da moralidade possui dois aspectos: a atuação do agente público e do Estado. Em ambos, é exigida conformidade com valores éticos, morais, de boa-fé e honestidade.
Nesse sentido, o princípio da boa-fé objetiva, amplamente debatido no Direito Civil, segundo o professor Flávio Tartuce, exige lealdade entre as partes, vinculando-as a deveres de conduta implícitos, inerentes a qualquer relação jurídica. [4] Não basta apenas parecer honesto; é necessário agir com lealdade.
A exigência de consolidação da legislação tributária, obrigação decorrente da relação tributária entre a administração pública e os cidadãos, é fundamentada nos princípios da moralidade e da boa-fé objetiva — este último como desdobramento daquele —, que impõem à administração pública a necessidade de atuar com lealdade, ética, transparência e honestidade, conferindo total clareza às normas aplicáveis às relações tributárias.
Quanto à consolidação das leis em geral, o art. 13 da Lei Complementar nº 95/98 prevê: “As leis federais serão reunidas em codificações e consolidações, integradas por volumes contendo matérias conexas ou afins, constituindo em seu todo a Consolidação da Legislação Federal.” Nota-se que a obrigação de consolidar a legislação é dirigida à União e às leis federais, dado que o texto menciona “leis federais” e se restringe aos atos normativos legais, não englobando normas infralegais.
Por sua vez, em matéria tributária, o art. 212 do Código Tributário Nacional (CTN) estabelece:
Art. 212. Os Poderes Executivos federal, estaduais e municipais expedirão, por decreto, dentro de 90 (noventa) dias da entrada em vigor desta Lei, a consolidação, em texto único, da legislação vigente, relativa a cada um dos tributos, repetindo-se esta providência até o dia 31 de janeiro de cada ano.
Assim, verifica-se que a obrigatoriedade prevista no CTN, diferentemente da Lei Complementar nº 95/98, recai sobre o Poder Executivo de todos os entes da federação, não sendo, portanto, exclusividade da União. Além disso, o CTN utiliza o termo “legislação tributária” em vez de “lei”, como consta no art. 13 da Lei Complementar nº 95/98.
Sobre a importância do referido art. 212 do CTN, o Desembargador Federal Leandro Paulsen afirma:
“Consolidação anual da legislação atinente aos tributos em espécie. O art. 212 do CTN toca em aspecto extremamente relevante, na medida em que o emaranhado de diplomas legislativos, muitas vezes, faz com que o conhecimento da legislação vigente seja tarefa hercúlea. A complexidade, a falta de sistematização, a ausência de técnica legislativa e, por fim, o não cumprimento da obrigação de proceder à consolidação da legislação fazem com que os contribuintes tenham enormes dificuldades em se orientarem quanto às suas obrigações tributárias. Aliás, não é raro que, dentro das próprias repartições fiscais, apenas um ou outro profissional tenha conhecimento exaustivo de determinadas matérias.” [5]
Nesse contexto, não resta dúvidas sobre a relevância da consolidação da legislação tributária, para garantir a observância dos princípios da eficiência, da publicidade, da transparência, da moralidade e da boa-fé objetiva e ao que estabelece o citado art. 212, do CTN.
Acerca do alcance do termo legislação tributária o art. 96, do CTN, estabelece o seguinte:
Art. 96. A expressão “legislação tributária” compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sôbre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.
Dessa forma, entende-se que a legislação tributária inclui tantos atos normativos legais (leis ordinárias, complementares, delegadas, medidas provisórias) quanto atos normativos infralegais (decretos, instruções normativas, resoluções, regimentos e portarias).
Diante do exposto, conclui-se pela obrigatoriedade da consolidação anual da legislação tributária pelos entes federativos, conforme a previsão legal nos artigos 96 e 212 do CTN e com fundamento nos princípios da eficiência, publicidade, transparência, moralidade e boa-fé objetiva.
Referências
[1] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 288.
[2] DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São Paulo: Malheiros. p. 672.
[3] DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São Paulo: Malheiros. p. 670.
[4] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 582.
[5] PAULSEN, Leandro. Direito Tributário CONSTITUIÇÃO E CÓDIGO TRIBUTÁRIO à luz da doutrina e da jurisprudência. 13. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado editora, ESMAFE, 2011. p. 1400.
Sobre o autor:
Assessor Especial da Presidência do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins – TCE/TO, Advogado, mais de dez anos de experiência no serviço público, tendo trabalhado no Ministério dos Transportes, no TJDFT, na Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, na Subchefia de Assuntos da Casa Civil da Presidência da República, na Prefeitura Municipal de Araguaína/TO como Presidente da Agência Municipal de Segurança Transporte e Trânsito e Subprocurador-Geral do Município, como Procurador-Chefe da Câmara Municipal de Araguaína, membro examinador de banca de pós-graduação lato sensu, Especialista em Prática Processual nos Tribunais pelo UniCEUB, Coordenador da Coleção Teses Defensivas e autor do livro “Teses Defensivas Improbidade Administrativa” da Editora Juspodivm. E-mail: diogoesteves.adv@gmail.com