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Empresa consegue anular cláusulas de reajuste por sinistralidade em plano de saúde coletivo com a SulAmérica

Justiça reconhece abusividade de cláusulas de reajuste em contrato coletivo com grupo reduzido de beneficiários e determina restituição dos valores

O juiz da 16ª Vara Cível da Comarca de São Paulo, Dr. Felipe Poyares Miranda, julgou procedente a ação proposta pela empresa MRP Comércio de Cosméticos Ltda. EPP contra a SulAmérica Companhia de Seguro Saúde e declarou nulas as cláusulas contratuais que previam reajustes por sinistralidade e variação de custos médico-hospitalares (VCMH). A sentença determinou a aplicação dos índices definidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para planos individuais e impôs à operadora a restituição dos valores cobrados a maior no período de três anos anteriores à propositura da ação.

Histórico da controvérsia

A empresa autora contratou plano de saúde coletivo empresarial com a ré e questionou judicialmente os aumentos sucessivos das mensalidades, alegando ausência de critérios objetivos e falta de transparência na justificativa dos reajustes. Sustentou, ainda, que os reajustes foram realizados de forma unilateral, com base em índices não comprovados e superiores aos autorizados pela ANS para planos individuais.

A operadora, por sua vez, defendeu a legalidade dos reajustes e afirmou que os aumentos seguiram cláusulas contratuais válidas e práticas de mercado.

Questão jurídica envolvida

A controvérsia jurídica tratou da validade dos reajustes aplicados com base na sinistralidade e na variação de custos médico-hospitalares em contratos coletivos empresariais. O ponto central foi a ausência de comprovação documental dos critérios utilizados e a falta de comunicação prévia ao contratante. O magistrado considerou essa prática abusiva, por violar o disposto no artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que veda cláusulas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou permitam alterações unilaterais no contrato.

Além disso, a sentença reconheceu que, embora o plano fosse formalmente coletivo, apresentava características típicas de planos individuais, por beneficiar um grupo reduzido de pessoas. Por isso, aplicou-se analogicamente a regulação da ANS voltada aos contratos individuais.

Efeitos práticos da decisão

Com a procedência do pedido, a SulAmérica deverá aplicar, desde o ano de 2020, apenas os percentuais de reajuste fixados pela ANS para os planos individuais. A operadora também foi condenada a restituir, de forma simples e com correção monetária pelo IPCA, os valores pagos em excesso pela autora nos três anos anteriores ao ajuizamento da ação. Os valores deverão ser acrescidos de juros moratórios calculados com base na taxa SELIC.

A decisão ainda condenou a ré ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil.

Repercussão da decisão e impacto social

A advogada da empresa, Dra. Aline Vasconcelos (OAB 27175/DF), afirmou que a decisão representa um importante precedente para consumidores vinculados a planos coletivos contratados por meio de microempresas, MEIs ou associações sem atividade efetiva. Segundo ela, muitos desses contratos, embora rotulados como coletivos, funcionam na prática como planos individuais e, por isso, devem seguir a regulação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

A profissional alertou que é possível pleitear judicialmente a revisão de cláusulas abusivas, inclusive para garantir a aplicação dos reajustes limitados pela ANS e coibir cancelamentos imotivados. Ela ressaltou que o Judiciário tem reconhecido com maior frequência a existência de “falsos coletivos”, reforçando a proteção ao consumidor diante de práticas contratuais que, sob o pretexto de liberdade negocial, impõem ônus excessivos e violam o equilíbrio contratual.

Legislação de referência

Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/1990

Art. 46 – Os contratos que regulam relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar prévio conhecimento de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Art. 51, IV – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada.

Art. 51, X – É nula a cláusula que permita ao fornecedor variar o preço de forma unilateral.

Código Civil – Lei 10.406/2002

Art. 389, parágrafo único – Se o objeto da prestação for o pagamento em dinheiro, responderá o devedor, também, pela atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos.

Art. 406 – Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.

Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015

Art. 355, I – O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas.

Lei 9.656/1998 – Dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde.

Art. 13, parágrafo único, II – É vedada a denúncia unilateral do contrato durante a ocorrência de internação do titular.

Constituição Federal

Art. 5º, XXXV – A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

Processo relacionado: 1004035-71.2024.8.26.0704

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