A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a responsabilidade civil solidária de um provedor de aplicativo de mensagens que não cumpriu ordem judicial para remover imagens íntimas de uma menor de idade. A empresa alegou impossibilidade técnica para excluir o material devido à criptografia ponta a ponta, mas o tribunal considerou sua omissão relevante para a continuidade do dano.
Questão jurídica envolvida
O caso envolveu a prática de “pornografia de vingança”, em que o ex-namorado da vítima compartilhou imagens íntimas por meio de um aplicativo de mensagens. A ação foi ajuizada contra ele e contra o provedor, e o juízo de primeira instância determinou a remoção do conteúdo, condenando apenas o ex-namorado ao pagamento de indenização. No entanto, o tribunal de segunda instância reconheceu a responsabilidade solidária do provedor e aumentou o valor da reparação.
Ao recorrer ao STJ, a empresa argumentou que não poderia remover o conteúdo devido à criptografia, que impediria o acesso às mensagens trocadas entre os usuários. A ministra relatora, Nancy Andrighi, destacou que, embora a criptografia limite a interferência no conteúdo das mensagens, a empresa não tomou qualquer atitude para mitigar os danos, como a suspensão ou banimento das contas do infrator.
Fundamentação jurídica
A relatora enfatizou que o compartilhamento de imagens íntimas por aplicativos de mensagens pode ser tão prejudicial quanto a divulgação em redes sociais ou fóruns públicos, já que as mensagens podem se espalhar rapidamente.
Além disso, afirmou que a alegação de impossibilidade técnica não foi acompanhada de prova pericial e que o Marco Civil da Internet exige compatibilização entre a proteção da privacidade dos usuários e a proteção das vítimas de crimes cibernéticos. Para a ministra, a empresa poderia ter adotado medidas alternativas, como o bloqueio temporário das contas envolvidas.
Impactos da decisão
A decisão reforça a responsabilidade das plataformas digitais em casos de violação de direitos fundamentais, mesmo quando a criptografia é utilizada como justificativa. O entendimento do STJ pode influenciar futuras ações judiciais envolvendo aplicativos de mensagens, especialmente em casos de crimes virtuais.
A posição do tribunal indica que provedores de serviço devem adotar medidas proativas para evitar a propagação de conteúdos ilícitos e proteger as vítimas, sob pena de serem responsabilizados solidariamente.
Legislação de referência
Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), artigo 19:
“Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente.”
Código Civil (Lei 10.406/2002), artigo 927:
“Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990), artigo 17:
“O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.”
Fonte: Superior Tribunal de Justiça