O Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) adote medidas efetivas para coibir cancelamentos unilaterais e injustificados de planos de saúde de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A recomendação foi emitida pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e pela Câmara de Consumidor e Ordem Econômica (3CCR), órgãos do MPF, que apontam a prática como discriminatória e contrária à legislação vigente.
Questão jurídica envolvida
O MPF sustenta que a rescisão unilateral de planos de saúde de pessoas com TEA configura violação ao direito à saúde e ao princípio da dignidade da pessoa humana, previstos na Constituição Federal. Além disso, fere normas como a Lei 12.764/2012, que estabelece a Política Nacional de Proteção dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista, e a Lei 13.146/2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência.
A recomendação destaca que as operadoras de planos de saúde não podem impor restrições de ingresso ou permanência a pessoas com deficiência, bem como limitar arbitrariamente a cobertura de tratamentos multidisciplinares essenciais ao bem-estar dos beneficiários.
Irregularidades apontadas pelo MPF
De acordo com o MPF, a omissão da ANS na regulamentação do tema tem permitido que operadoras de planos de saúde adotem práticas abusivas, como a rescisão unilateral de contratos de usuários com TEA e a restrição indevida de sessões de terapia multidisciplinar. Entre as medidas sugeridas, o órgão propõe:
- Identificação de práticas discriminatórias ilegais nos sistemas da ANS;
- Maior fiscalização sobre o descredenciamento de clínicas que atendem autistas;
- Garantia de acesso às informações contratuais e aos serviços oferecidos;
- Impedimento da imposição de limites arbitrários a tratamentos multidisciplinares.
A recomendação foi motivada pelo crescente número de reclamações e pela judicialização de casos envolvendo cancelamentos unilaterais de planos de saúde de pessoas com deficiência. A ANS recebeu mais de 36 mil denúncias de negativas de atendimento para beneficiários com TEA entre 2022 e 2024.
Legislação de referência
Lei 12.764/2012 – Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos das Pessoas com Transtorno do Espectro Autista.
Art. 1º – Fica instituída a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, que assegura a essas pessoas o acesso aos direitos fundamentais garantidos a todos os cidadãos.
Art. 2º, § 3º – A pessoa com transtorno do espectro autista não será impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição.
Lei 9.656/1998 – Dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde.
Art. 14 – É vedada a exclusão de cobertura assistencial a portadores de doenças ou lesões preexistentes.
Art. 30 – O consumidor que contribuiu para o plano coletivo por período mínimo de dez anos tem direito à manutenção do benefício, desde que assuma o pagamento integral após desligamento da empresa contratante.
Art. 35-C, I – Os planos de saúde são obrigados a garantir cobertura para atendimento de todas as doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Lei 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência) – Estabelece direitos e garantias para pessoas com deficiência.
Art. 4º – Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades, não sofrendo discriminação de qualquer natureza.
Art. 13 – É obrigatória a adoção de medidas para eliminar barreiras na comunicação e no acesso a informações por parte de pessoas com deficiência.
Art. 23, III – As operadoras de planos e seguros privados de saúde são obrigadas a garantir às pessoas com deficiência, no mínimo, todos os serviços e produtos oferecidos aos demais clientes.
Art. 88 – Recusar, retardar ou dificultar internação ou deixar de prestar assistência médico-hospitalar e ambulatorial à pessoa com deficiência constitui crime, punível com reclusão de 2 a 5 anos e multa.
A ANS tem o prazo de 45 dias para informar ao MPF quais providências serão adotadas para combater essas práticas abusivas.
Fonte: Ministério Público Federal (MPF)