A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a jurisprudência de que a ação de nulidade do registro de marca só é imprescritível quando há comprovação de má-fé do registrador e notoriedade da marca no momento do registro. A decisão ressaltou a importância de analisar o comportamento das partes envolvidas para determinar a existência de má-fé.
Caso Speedo: um histórico de acordos comerciais
O julgamento envolveu as detentoras internacionais da marca Speedo, que solicitaram a nulidade ou adjudicação de todos os registros da marca concedidos pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) a empresas de um ex-atleta brasileiro de pólo aquático desde 1980. O pedido das empresas estrangeiras foi negado pelos ministros, que consideraram contraditória a conduta dos proprietários da marca, visto que mantiveram uma relação comercial com as empresas do ex-atleta por 30 anos.
De acordo com o processo, a marca Speedo é fabricada e pertence a empresas estrangeiras desde 1914, tornando-se mundialmente conhecida em competições olímpicas. No Brasil, a marca obteve registro no INPI em 1970, mas o perdeu por caducidade em 1976. O ex-atleta brasileiro registrou a marca em 1980, obtendo o direito em 1985 e transferindo-o para empresas de sua família. Até 2006, as partes mantiveram acordos comerciais com pagamento de royalties às empresas estrangeiras, sendo a falta de pagamento por parte da marca brasileira a causa da extinção do contrato vigente. Em 2010, o grupo internacional iniciou uma ação judicial para recuperar a marca.
Jurisprudência e imprescritibilidade da ação de nulidade
O relator do recurso na Quarta Turma, ministro Raul Araújo, destacou que o artigo 174 da Lei 9.279/1996 fixa um prazo de prescrição de cinco anos para ações de nulidade de registro de marca. No entanto, a Convenção da União de Paris (CUP) de 1883 prevê que o pedido de nulidade não prescreve se houver má-fé do registrador e a marca for notoriamente conhecida no momento do registro indevido.
No caso em questão, as instâncias inferiores concluíram que, quando o atleta brasileiro obteve o registro da marca, a Speedo não era notoriamente conhecida pelo público brasileiro. Além disso, o ministro observou que, mesmo que houvesse má-fé, sua eficácia foi suspensa durante os 30 anos em que as partes mantiveram uma relação comercial harmoniosa.
“A alegação de que a imprescritibilidade é objetiva e não requer análise do comportamento das partes não pode ser aceita. A má-fé é dolo, é uma intenção deliberada de agir, o que está intimamente ligado ao comportamento das partes”, afirmou o ministro Raul Araújo.
Restabelecimento parcial da sentença e futuro da marca
Embora tenha negado a nulidade total do registro, a Quarta Turma restabeleceu parcialmente a sentença, determinando que o registro da marca pela empresa brasileira não fosse renovado. Isso permitirá que a marca Speedo e seu “arrow device” retornem gradualmente aos seus proprietários internacionais, desde que cumpram os requisitos legais para os registros, evitando um rompimento abrupto com a realidade até então existente.
Questão jurídica envolvida
A decisão do STJ discute a aplicação da imprescritibilidade em ações de nulidade de registro de marca, destacando que essa imprescritibilidade depende da demonstração de má-fé e notoriedade da marca no momento do registro. O tribunal reforça a necessidade de considerar o comportamento das partes ao determinar a intenção de má-fé.
Legislação de referência
- Artigo 174 da Lei 9.279/1996 (Lei da Propriedade Industrial):
“Prescreve em cinco anos a ação para anular o registro, contado este prazo da data de sua concessão.” - Convenção da União de Paris (CUP) de 1883:
A convenção internacional prevê que a ação de nulidade do registro não prescreve quando o registro é feito de má-fé e a marca é notoriamente conhecida.
Processo relacionado: REsp 2061199