A 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) condenou, por unanimidade, o Distrito Federal a indenizar mãe e filha por danos morais devido à demora na realização de uma cirurgia cardíaca em uma menor que nasceu com síndrome de Down. O colegiado decidiu aumentar o valor das indenizações em 50% para cada uma das autoras, reconhecendo a gravidade dos sofrimentos físicos e emocionais enfrentados.
O contexto da ação e o agravamento da condição da criança
A mãe da criança relatou que a menina nasceu em fevereiro de 2020, já com diagnóstico de síndrome de Down e uma grave cardiopatia. Apesar de a cirurgia cardíaca ser necessária desde o nascimento, a criança foi inicialmente internada por um mês e depois liberada sem previsão de cirurgia. Com o agravamento de seu estado de saúde, a menina foi transferida para o Hospital da Criança de Brasília, onde sofreu três paradas cardíacas e passou quatro meses na UTI pediátrica, utilizando ventilação mecânica e precisando de uma traqueostomia.
A cirurgia foi realizada somente em outubro de 2020, após intervenção judicial, mas a mãe alegou que a demora no procedimento causou grande sofrimento físico, emocional e mental, levando à perda de seu emprego para poder acompanhar a filha no hospital. Ela argumentou que a cirurgia, se realizada antes dos três meses de vida, poderia ter evitado os riscos de morte e as sequelas na menor.
A defesa do Distrito Federal e a opinião do Ministério Público
O Distrito Federal se defendeu alegando que a criança recebeu todo o atendimento disponível na rede pública e que a equipe médica conseguiu mantê-la estável até que fosse possível realizar a cirurgia. O Ministério Público, no entanto, após o recurso das autoras, recomendou o aumento das indenizações, considerando os princípios de razoabilidade e proporcionalidade.
Fundamentação do Tribunal e o aumento das indenizações
A desembargadora relatora afirmou que a sentença deixou claro o sofrimento das autoras e a demora injustificada na realização da cirurgia, que ocorreu apenas aos oito meses de vida da criança, devido à falta de material cirúrgico. Ela também mencionou que o nascimento da criança ocorreu durante a pandemia de Covid-19, o que impactou os sistemas de saúde globalmente, mas destacou que esse fato não justifica a omissão no caso específico.
Diante do exposto, o colegiado decidiu elevar as indenizações para R$ 20 mil à criança e R$ 10 mil à mãe, levando em conta o enorme desconforto, angústia e sofrimento causados pela demora na cirurgia.
Questão jurídica envolvida
O caso reforça a responsabilidade do Estado na prestação adequada e tempestiva de serviços de saúde, especialmente em situações críticas que envolvem a vida de crianças com condições graves. A decisão também sublinha a aplicação dos princípios de razoabilidade e proporcionalidade na fixação de indenizações por danos morais.
Legislação de referência
- Constituição Federal:
- Art. 196: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”
- Código Civil (Lei 10.406/2002):
- Art. 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
- Art. 927: “Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Processo relacionado: 0708123-22.2020.8.07.0018