A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que um recurso interposto após a parte ter erroneamente renunciado ao prazo processual devido a um erro no sistema eletrônico deve ser aceito para julgamento. O colegiado entendeu que o erro configurou um vício de vontade, justificando a anulação da renúncia para preservar os princípios da razoabilidade, confiança e boa-fé processual.
Contexto do caso
O caso envolveu uma ação de execução de título extrajudicial, onde uma das partes, ao utilizar o sistema eletrônico do tribunal de segundo grau, renunciou ao prazo para recorrer sem ter a intenção de fazê-lo. A renúncia foi realizada ao selecionar, equivocadamente, um campo específico no sistema, mas sem a formalização de uma petição. Posteriormente, essa mesma parte interpôs um agravo contra uma decisão da corte.
A parte adversa argumentou que o recurso não deveria ser conhecido, já que a renúncia expressa ao prazo havia sido registrada no sistema. Contudo, o tribunal estadual considerou que o recurso atendia aos pressupostos de admissibilidade e que a renúncia registrada no sistema não era válida, pois se tratava de um erro material.
Princípio da boa-fé e anulação da renúncia
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ, destacou que o artigo 225 do Código de Processo Civil (CPC) permite a renúncia ao prazo processual, desde que realizada de forma expressa e inequívoca. No entanto, a ministra apontou que o erro no manuseio do sistema eletrônico pode ser considerado um vício de vontade, afetando a validade do ato processual, conforme prevê o artigo 138 do Código Civil.
Ao concluir que o erro era material e que a parte claramente pretendia recorrer, a relatora defendeu a anulação da renúncia. Ela ressaltou que essa interpretação é alinhada com a jurisprudência do STJ, que favorece a aplicação dos princípios da boa-fé, razoabilidade e confiança em situações de erro escusável.
Com essa decisão, a Terceira Turma do STJ reforçou a importância de uma abordagem flexível e justa na interpretação dos atos processuais, visando garantir que as partes tenham suas demandas analisadas com base na realidade dos fatos e na intenção genuína dos envolvidos.
Questão jurídica envolvida
A questão jurídica principal é a aplicação dos princípios de boa-fé e razoabilidade em casos onde um erro material no uso de sistemas eletrônicos afeta a renúncia de prazos processuais, bem como a interpretação dos atos processuais para preservar os direitos das partes.
Legislação de referência
- Artigo 225 do Código de Processo Civil (CPC): “A parte poderá renunciar ao prazo estabelecido exclusivamente em seu favor, desde que o faça de maneira expressa.”
- Artigo 138 do Código Civil: “É anulável o negócio jurídico, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.”
Processo relacionado: REsp 2126117